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A famosa pergunta: “onde você se vê daqui dez anos?”
Uma pergunta na qual nunca pensei. Talvez nunca quis pensar. Até alguns anos atrás, nunca precisei fazer planos. Nascido e criado com segurança financeira, se tudo desse errado, teria a barra da saia da mãe para voltar.
As perspectivas para dez anos eram tantas que era impossível fazer planos… Tantas oportunidades! Coisas que eu jamais imaginaria, portas que eu não sabia que existiam se abrindo…
Oportunidades de emprego pouco ortodoxas. Quantos médicos já passaram por navios de cruziero, por plataforma de petróleo, pelo exército, por ambulâncias…
Medicina apresenta muitas portas. É impossível ter uma decisão completamente racional, pesar todos os prós e contras de uma escolha, afinal de contas, o mundo é dinâmico e fluido. O que parece uma excelente escolha hoje, talvez daqui dez anos prove que foi completamente errada.
Mas eu nunca me perguntei onde estaria daqui dez anos porque as oportunidades eram tantas e eu tinha certeza de que seriam diferentes e únicas.
Isso também era verdade nos meus relacionamentos. Sem apego à um emprego ou à uma pessoa, havia infinitas possibilidades, infinitos caminhos, infinitas escolhas, infinitos “eu daqui dez anos”.
Claro que cada porta escolhida significa outras tantas fechadas. Escolhi o caminho da estabilidade. Um relacionamento, um emprego fixo, um lar, uma cachorra…
O problema é que o “eu daqui dez anos” parece muito mais previsível. Ainda há infinitas portas, infinitas possibilidades e infinitas escolhas, mas por algum motivo elas parecem um infinito menor do que eram.
Talvez seja a inércia, tão amiga quanto inimiga. A zona de conforto, que é… confortável, oras! Ou deveria ser.
Por que a perspectiva da casinha de cerca branca parece tão chata? Por que eu namoro a idéia de ir para algum lugar longe do conforto? Explorar o desconhecido é tão humano quanto ficar na zona de conforto. Voltamos à inércia. Inércia de ficar parado no conforto, inércia de continuar procurando o desconhecido.
O “eu daqui dez anos” é um filho de um pessimista agora, ele tem tudo para ser quem ele quiser. Pode ser um explorador dentro de casa, com as infinitas oportunidades que aparecem a cada dia. Mas ele parece querer só ficar sentado na mesmice, olhando o relógio, vendo os minutos e horas derretendo, vendo as portas fechadas e não as abertas. Reclamando disso. Reclamando daquilo.
A falta de perspectiva é o que vai acabar com a humanidade como a conhecemos. É o que vai deixar Galileus, Armstrongs, Teslas de cabeça baixa, fones de ouvido como grilhões amarrando à uma tela brilhando azul, por sua vez presa à uma parede. E o cérebro desligado, vendo os dias passarem, esperando um messias, uma epifania, um meteoro…